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Como suspeitar de autismo numa avaliação psicopedagógica
 

Por: Simaia Sampaio

Psicóloga, Neuropsicóloga e Psicopedagoga

 

      É incomum recebermos crianças para diagnóstico psicopedagógico antes dos cinco anos de idade, no entanto, eventualmente, recebemos alguns encaminhamentos da escola, após professores observarem que a criança não está acompanhando o ritmo da classe. 

      Temos observado que alguns professores têm entendido que quanto mais uma criança demorar para receber assistência e estimulação especializada, mais comprometido fica seu desenvolvimento.

      Não cabe ao psicopedagogo dar qualquer diagnóstico em relação a alterações no comportamento, pois esta é uma função do médico psiquiatra ou neurologista, mas durante os atendimentos, o psicopedagogo clínico será capaz de perceber se a criança está respondendo como uma criança de sua idade, se sua aprendizagem está fluindo bem ou se há atraso em seu desenvolvimento, seja em relação à linguagem, à psicomotricidade ou ao comportamento que possa prejudicar sua aprendizagem acadêmica.

         Para tanto é imprescindível que o psicopedagogo tenha conhecimento das fases de desenvolvimento infantil, e experiência na observação de crianças pequenas para que tenha condições de suspeitar de alguma alteração mais acentuada no comportamento. Poderá utilizar alguns instrumentos avaliativos como o IDADI.

      O autismo é uma síndrome difícil de ser diagnosticada quando não é a forma mais grave da doença. Ela afeta as crianças em diferentes níveis, mas é possível perceber alguns traços do espectro do autismo neste ambiente lúdico da psicopedagogia.

      Para uma criança na idade de três a seis anos não necessitamos de muitas sessões para a avaliação, pois não há provas a serem aplicadas. Reservamos cerca de três a quatro sessões para realizar uma observação lúdica da interação desta criança com o ambiente, além das que devem ser realizadas com os pais como anamnese e devolutiva. Ao realizar a primeira sessão com a criança, que chamamos de EOCA (Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem) devemos oferecer-lhe alguns brinquedos de montar, de encaixar e dentre estes alguns que contenham coisas que giram, pois o autista tem um fascínio por objetos que rodam e podem ficar por um longo tempo envolvido nesta ação de girar, como rodas de carro por exemplo. Devemos também deixar à disposição objetos que possam ser classificados por tamanho, por cores, pois esta é outra característica do autista. O autista não interage de maneira lúdica com estes brinquedos, ele não brinca, ele procura organizá-los de uma forma sistemática geralmente colocando-os enfileirados. O mundo do autista é um mundo metódico e sistemático, onde ele gosta que as coisas estejam sempre do mesmo jeito, na mesma ordem, priorizam ao máximo a rotina e se sentem confortáveis e seguros com ela. Podem ficar nervosos e agitados se encontrarem um móvel fora do lugar na sessão seguinte. É por isto que não é qualquer consultório que pode receber uma criança autista, pois este deve ser organizado para ter o mínimo de estímulos que possam afetar a sensibilidade natural destas crianças.

      Devemos observar também se esta criança apresenta maneirismo, estereotipias, ou seja, se há movimentos atípicos com as mãos como se as mexessem no ar, ou se seguem rituais. É possível que estes comportamentos não se apresentem de forma intensa no consultório, mas deverão ser sondados com a família durante a anamnese.

Observe durante as sessões se ela utiiza sua mão como ferramenta, ou seja, se ao invés dela pegar o objeto ela pega sua mão e leva até o objeto para que você pegue. É importante lembrar que nem todos os sintomas irão estar presentes em uma mesma criança com autismo.

             Normalmente a criança autista possui dificuldades em imitar gestos. Então um teste bem simples é solicitar que a criança imite alguns gestos corporais, manuais e faciais. Também possui dificuldade em reconhecer expressões faciais, ou seja, dificuldade em identificar quando o outro está feliz, triste, com cara de nojo, de espanto etc. É interessante fazer cartões com imagens de pessoas com diversas expressões e pedir que a criança as identifique.

      É importante deixar a criança livre com bonecos, carrinhos etc para observarmos como a criança interage, se há um brincar intencional, o que não acontece com o autista.

     O profissional deverá observar se a criança atende quando é chamada. Esta questão é muitas vezes confundida com uma surdez, por isto é sempre importante solicitar uma audiometria recente, em qualquer diagnóstico, para estar pronta antes do fechamento da avaliação. É comum que o profissional pense em um TDAH quando sabe que a criança ouve bem, mas não atende quando é chamada. Neste caso é importante avaliar outros aspectos, pois o tdah pode não olhar por estar distraído, mas não apresentará outros sintomas que já foram descritos e um muito importante que deve ser levado em consideração que é o olhar. Os autistas pouco ou quase nunca olham pelo incômodo que sentem. Carly, que vive nos EUA, é uma autista que conseguiu se comunicar através de um computador a partir dos dez anos de idade e contou que ao olhar para o rosto de uma pessoa, é como se seu cérebro tirasse milhares de fotografias o que a incomoda e faz com que evite o contato ocular.

      Considerando que o autismo tem base genética é importante observar este pai ou esta mãe quando conversamos com eles. Existem autistas adultos que podem passar despercebidos, que se casam e nunca receberam diagnóstico, mas possuem um relacionamento muitas vezes conturbado pela dificuldade em expressar seus sentimentos ou entender os do cônjuge. Ao realizarmos a anamnese devemos estar atentos como se comportam este pai ou esta mãe, se nos evitam olhar nos olhos, se há uma inquietação, devemos perguntar se ficam incomodados com barulhos, como é sua organização etc.

     Uma visita à escola é imprescindível para observar sua interação social, sua comunicação que são as áreas mais comprometidas da criança autista. Normalmente tendem a isolar-se do grupo, mesmo quando sua linguagem se desenvolve assim como sua cognição como é o caso do Asperger, mas que também está dentro do espectro do autismo.

    Chegamos agora num ponto que gostaria de chamar bastante atenção. Muitos psicopedagogos recebem alguns adolescentes para avaliação psicopedagógica, aplicam as provas operatórias, identificam que seu cognitivo está bem. Sua linguagem é desenvolvida, porém muitas vezes há alterações na prosódia e apresentam manias e isolamento. O psicopedagogo poderá pensar que são hábitos da adolescência ou que é um adolescente tímido, mas inteligente e não suspeitam de um possível espectro do autismo. Normalmente estes adolescentes são retraídos, não gostam de contato social, apresentam fixação por um determinado assunto, evitam o contato visual e apresentam alguns rituais de comportamento. Muitas vezes já passaram por outros profissionais que nem suspeitaram de que pudesse se tratar de Síndrome de Asperger.

      Particularmente já tive duas situações em que supervisionei psicopedagogas diferentes, realizando avaliação de adolescente e que não se deram conta de que poderia se tratar do espectro autista, pois havia maneirismo, isolamento social e apesar de terem a linguagem preservada a prosódia era alterada.

       O objetivo de uma avaliação precoce é possibilitar que esta criança tenha a chance de ser submetida às terapias adequadas enquanto sua rede de neurônios ainda esteja apta a realizar novas conexões com mais facilidade, pois a re-habilitação torna-se mais difícil caso esta fase seja ultrapassada sem estímulos adequados.

                 A terapia mais indicada é a cognitivo comportamental, através da qual a criança irá aprender que não precisa se agredir para se comunicar. Ela irá aprender uma nova linguagem de comunicação, a agir com mais autonomia, a saber esperar, etc. A instituição AMA trabalha desta forma, infelizmente são poucas as vagas. Um consultório de psicopedagogia poderá se propor a trabalhar sua mobilidade cognitiva, sua autonomia, mas irá sempre precisar de um trabalho multidisciplinar envolvido, mesmo que não seja no mesmo espaço, cuja equipe deverá estar sempre conversando e traçando os melhores caminhos de tratamento, nunca esquecendo que os pais também deverão passar por um processo de psicoterapia, pois normalmente abandonam suas vida em prol desta criança.

 


 

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