TDAH - Transtorno de Déficit de Atençãoe Hiperatividade: informações e orientações
Por: Simaia Sampaio
(Ver forma de referenciar ao final do texto).
O estudo do TDAH - Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade não é recente. Estudos científicos sobre o assunto vêm sendo realizados desde o começo do século XX.
Um dos primeiros autores a escrever sobre o assunto foi Dupré, no período da Primeira Guerra Mundial, que acreditava tratar-se de uma lesão cerebral mínima.
No início da década de 1960, conferências como a do Oxford International Study Group of Child Neurology (1962–1963) promoveram a transição dos termos “mínimo dano cerebral” para “mínima disfunção cerebral”, reconhecendo que nem sempre havia evidência anatômica de lesão, mas sim déficits funcionais no sistema nervoso central (LANGE, 2010).
Em 1962, num simpósio de Oxford, foi oficializado a expressão Disfunção Cerebral Mínima. Em 1966, um grupo de estudos concluiu que esta disfunção pode originar-se de variações genéticas, irregularidades bioquímicas, sofrimento perinatal, moléstias ou traumas sofridos durante os anos críticos para a maturação do sistema nervoso central.
Esta expressão foi utilizada no meio científico até 1980, quando a Associação Psiquiátrica Americana (APA) propôs uma nova denominação: Síndrome do Déficit de Atenção. Esta denominação passou a englobar tanto a hiperatividade como as demais funções que originam da falta de maturação do sistema nervoso central tais como: incoordenação motora, falta de equilíbrio, distúrbios de fala, alteração de sensibilidade, distúrbios de comportamento e dificuldades escolares.
Estudos, como o de A. Towbin (1971), apontaram que lesões perinatais, hipoxias e traumas leves podem gerar disfunção neurológica mínima, corroborando a abordagem multifatorial, abrangendo etiologia genética, bioquímica e ambiental
George Frederic Still, em 1902, fez alguns estudos com grupos de crianças que apresentavam características agitadas, desafiadoras, agressivas, passionais, com a finalidade de obter delas um comportamento mais aceitável. Descobriu que, por não existirem maus tratos pelos pais, os problemas deveriam ser de origem biológica, pois alguns membros da família possuíam problemas psiquiátricos como depressão, problemas de conduta, alcoolismo, dentre outros (HALLOWELL, 1994, p. 271).
Causas
Estudos têm relacionado a ocorrência do transtorno a problemas durante a gravidez e parto. Estudos apontam que as chances de uma criança sofrer de hiperatividade e déficit de atenção aumenta se a gestante tiver contato com algumas substâncias, dentre elas: utilização de drogas durante a gravidez tais como opioides e cannabis (GARRISON‑DESANY, H. M. et al., 2022), ingestão de álcool (Pagnin D, 2019), nicotina (Yan He, 2020), antibióticos (TAO, Q. et al., 2022). A nicotina atravessa a placenta, impactando neurotransmissores dopaminérgicos envolvidos em atenção e controle comportamental. O feto também pode sofrer efeitos de hipóxia causada pelo CO do cigarro, prejudicando ainda mais o desenvolvimento cerebral (MOHAMMADIAN, M., 2025). Infecções virais e bacterianas durante a gravidez também podem interferir no desenvolvimento neurológico do bebê (WALLE, 2019). Alguns estudos ligam o TDAH ao consumo de alguns alimentos durante a gestação e também o contato de gestantes com alguns produtos químicos como Ftalatos (ENGEL, 2021), poluentes domésticos como fenóis, desinfetantes, solventes (LEE, S. et al, 2024), exposição maternal pré-natal a pesticidas (XU, Y. et al. 2022); Dieta pré-natal pouco saudável (Rijlaarsdam, J., 2017).
Alguns estudos também apontam para causa relacionada à hereditariedade. Em estudo de (Faraone , 2018), com 894 casos de TDAH e 1.135 irmãos, foi observado risco 9 vezes maior de TDAH em irmãos de probandos comparado ao grupo controle. Esta revisão indica risco frequentemente 5–10 vezes maior para parentes de primeiro grau, pais ou irmãos. Dados de adoção corroboram que a transmissão familiar do TDAH não decorre do ambiente compartilhado, mas sim de fatores genéticos, já que filhos biológicos de pais com TDAH apresentam risco mais elevado do que filhos adotivos.
Portadores do TDAH apresentam uma taxa menor de dopamina, um neurotransmissor responsável pelo controle motor e atenção, tendo como conseqüência a falta de concentração e o esquecimento daquilo que lhe é pedido. A área pré-frontal do cérebro, responsável pelo controle executivo, depende de níveis ótimos de dopamina e norepinefrina. No TDAH, a estimulação dopaminérgica através desses receptores está subativa, o que implica dificuldades em manter atenção, controle motor e memória de tarefas. O uso de estimulantes (ex.: metilfenidato) melhora os sintomas justamente por aumentar a disponibilidade sináptica de dopamina.
Estatísticas internacionais indicam que o TDAH é diagnosticado 3 a 5 vezes mais frequentemente em meninos do que em meninas em contextos clínicos, e cerca de 3:1 na população geral escolar (SMITH e STRICK, 2001). Existem chances elevadas de que o transtorno provoca baixo rendimento escolar, baixa auto-estima e pode dificultar os relacionamentos entre os colegas. Muitos sintomas do TDAH são muitas vezes confundidos com indisciplina, principalmente aqueles com a apresentação hiperativa/impulsiva.
Diagnóstico
Para o diagnóstico, é importante se levar em conta o tempo que a criança começou a apresentar os sintomas. Segundo o DSM-5-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) os sintomas deverão ser ininterruptos, com duração mínima de seis meses, devem estar presentes antes dos 12 anos de idade, sem limitar-se a apenas uma situação, ou seja, deve estar presente no mínimo em dois ambientes.
A criança não precisa, necessariamente, apresentar todas as características descritas nos critérios diagnósticos, mas são exigidos no mínimo seis sintomas de desatenção de um total de nove e/ou seis sintomas de hiperatividade e impulsividade de um total de nove. Contudo, na apresentação desatenta, nem sempre as escalas conseguirão rastrear, principalmente se for em nível leve. Sim! O TDAH tem níveis, conforme o DSM-5-TR (2023):
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"Leve: Pouco sintomas, se algum, estão presentes além daqueles necessários para fazer o diagnóstico, e os sintomas resultam em não mais do que pequenos prejuízos no funcionamento social ou profissional.
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Moderado: Sintomas ou prejuízo funcional entre "leve" e "grave" estão presentes;
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Grave: Muitos sintomas além daqueles necessários para fazer o diagnóstico estão presentes, ou vários sintomas particularmente graves estão presentes, o9u os sintomas podem resultar em prejuízo acentuado no funcionamento social ou profissional."
Características do TDAH com Predominância de Hiperatividade e Impulsividade
A apresentação hiperativo/impulsivo do TDAH é caracterizado por comportamentos marcadamente inquietos, impulsivos e com dificuldade para controlar os próprios impulsos e movimentos. Crianças com esse perfil se levantam frequentemente da carteira, falam excessivamente, interrompem conversas, não conseguem esperar sua vez em atividades em grupo e respondem perguntas antes mesmo de serem concluídas. A impulsividade pode gerar consequências sociais negativas, como dificuldades nos relacionamentos e baixa tolerância a frustrações.
Características do TDAH em criança ou adulto com hiperatividade pode se manifestar em diferentes contextos e situações do cotidiano. É comum que apresente comportamentos como bater os pés repetidamente, levantar-se com frequência, cantar ou assobiar em momentos inadequados, demonstrar impaciência em filas, não permanecer sentado durante as refeições, trocar constantemente de canal ao assistir televisão, realizar movimentos corporais excessivos e bruscos, além de apresentar sono agitado e dificuldade para perceber o tempo.
Durante a infância, especialmente nos primeiros anos de vida, é possível observar sinais precoces, como sono inquieto e movimentação intensa durante o repouso.
A criança com hiperatividade costuma apresentar incoordenação motora. Dificuldades são observadas em atividades como andar de bicicleta ou patins, pular corda, subir em árvores, abotoar roupas, amarrar os sapatos, realizar recortes com tesoura e arremessar bolas.
Hiperatividade e aprendizagem
Segundo Golfeto (1992, p. 12), crianças hiperativas apresentam dificuldades em distinguir direita e esquerda, alterações na memória visual e auditiva, desorientação espacial, prejuízos na discriminação auditiva e na elaboração de sínteses auditivas, além de má estruturação do esquema corporal. De modo geral, são crianças desorganizadas, distraídas, esquecidas e resistentes a limites. Possuem dificuldade em finalizar tarefas e manter relacionamentos com os colegas. Essas características tornam-se ainda mais evidentes no contexto escolar, no qual a concentração é elemento fundamental para a aprendizagem.
Também é comum que haja atraso no desenvolvimento da linguagem.
Na escola, são frequentemente rotuladas como "crianças-problema". Podem apresentar comorbidade com comportamentos desafiadores e opositores, agressividade verbal e/ou física, desrespeito a limites, dificuldades de atenção e impulsividade, o que compromete o desempenho acadêmico. São, muitas vezes, descritas pelos professores como desorganizadas. Demonstram dificuldade em iniciar e concluir atividades, alternando rapidamente de interesse entre diferentes tarefas, o que resulta em prejuízos significativos na aprendizagem. A crítica constante por parte de professores e colegas pode afetar negativamente sua autoestima.
Indivíduos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) frequentemente enfrentam rejeição social em razão de seus comportamentos considerados inadequados, especialmente no contexto escolar e social. A impulsividade e a agitação excessiva podem prejudicar o ambiente coletivo, comprometendo a concentração dos colegas, o que frequentemente resulta em exclusão social. Tal exclusão, quando recorrente, pode desencadear consequências emocionais graves, como baixa autoestima, comportamento agressivo ou retraído, bem como manifestações de caráter exibicionista.
Hiperatividade e ambiente familiar
No ambiente familiar, esses comportamentos também costumam gerar grande desgaste. A criança hiperativa tende a bagunçar o quarto, subir em móveis, recusar-se a permanecer sentada durante as refeições e a obedecer às regras estabelecidas. É fundamental que os pais estejam atentos aos sinais de comportamento excessivamente agitado, principalmente quando estes se associam a queixas escolares. Nestes casos, recomenda-se a busca por avaliação especializada. Ressalta-se a importância de que os sintomas estejam presentes em mais de um ambiente (escola, casa, outros). Isto é um critério diagnóstico. A manifestação restrita a um único contexto pode estar relacionada a fatores situacionais, como a chegada de um irmão, a ausência prolongada dos pais ou a carência de atenção emocional.
Desde a infância, crianças com TDAH estão mais expostas a acidentes, devido à impulsividade e à dificuldade em avaliar situações de perigo. Comportamentos como atravessar ruas sem atenção, tropeçar com frequência ou quebrar objetos são comuns, resultando, por vezes, em consequências físicas e prejuízos a terceiros. Tais atitudes, embora muitas vezes atribuídas à desobediência, têm origem em déficits neurobiológicos relacionados ao transtorno.
Estudos clínicos sugerem que esses indivíduos estão mais suscetíveis a comportamentos de risco, incluindo envolvimento com substâncias psicoativas, jogos compulsivos e episódios de explosividade emocional. Esses comportamentos estão, em grande parte, associados à baixa percepção de limites e à tentativa de fuga de frustrações e sentimentos de inadequação.
Hiperatividade e Diagnóstico
O diagnóstico desse subtipo requer observação em múltiplos contextos e por diferentes fontes (pais, professores e profissionais da saúde), além da aplicação de escalas e entrevistas estruturadas. Como os sintomas são mais visíveis e disruptivos, essa é, geralmente, a manifestação diagnosticada com maior precocidade, sendo comum já na educação infantil.
No entanto, deve-se ter cuidado para não confundir comportamentos compatíveis com a faixa etária ou com quadros ansiosos, opositores ou outras condições psiquiátricas. A avaliação clínica especializada deve verificar se os sintomas causam prejuízo funcional relevante, se estão presentes em diferentes situações e se persistem por mais de seis meses.
O diagnóstico é feito pelo médico, após excluir outras condições de saúde. O neuropsicólogo, com formação em psicologia, também pode realizar o diagnóstico. Inclusive, o ideal seria que a criança passasse primeiramente por este profissional, que aplicará diversos testes e escalas com informantes, e terá uma visão mais aprofundada, uma vez que a avaliação leva cerca de oito sessões para ser concluída. Assim sendo, o médico teria melhores condições de avaliar se tem ou não TDAH com o laudo neuropsicológico em mãos, junto à sua avaliação médica.
Quem não faz diagnóstico de TDAH: psicopedagogos, neuropsicopedagogos, pedagogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais. Contudo, se a criança ou adolescente passar por estes profissionais antes do médico, e estes sejam estudiosos do transtorno, poderão levantar hipóteses diagnósticas e encaminhar para avaliação neuropsicológica e médica. A visão destes profissionais é importantíssima no processo diagnóstico.
Características do TDAH com Predominância de Déficit de Atenção
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) com apresentação desatenta apresenta-se de maneira menos evidente do que o subtipo hiperativo, sendo, muitas vezes, negligenciado tanto na família quanto no ambiente escolar. Crianças e adultos com esse perfil não costumam manifestar agitação motora, mas demonstram apatia, lentidão na realização das tarefas, dispersão frequente e dificuldades em manter a atenção sustentada. São indivíduos que "parecem viver no mundo da lua", com frequência não concluem o que começam, esquecem instruções simples, perdem objetos com facilidade e têm dificuldade para seguir rotinas.
Ressalta-se que não se trata de ausência de atenção, mas sim de uma atenção fragmentada e distribuída entre múltiplos estímulos, o que compromete a concentração.
Ao contrário do que muitos acreditam, essa criança não escolhe “não prestar atenção”. Trata-se de uma dificuldade neurobiológica em manter o foco, sobretudo em tarefas que não sejam altamente estimulantes. Ela pode se concentrar intensamente em atividades de interesse específico, como jogos ou desenhos, mas demonstra grande dificuldade com tarefas escolares rotineiras, que exigem esforço cognitivo contínuo.
A criança com TDAH com apresentação desatenta, pode também apresentar problemas de organização, dificuldade para administrar o tempo, iniciar e finalizar tarefas, e tendência a procrastinar. São frequentemente descritas como lentas, desmotivadas ou distraídas, e podem parecer desinteressadas ou desatentas às interações sociais, o que, por vezes, gera isolamento ou dificuldades na construção de vínculos com os colegas.
De acordo com Golfeto (1992), esse perfil pode estar associado a alterações na memória auditiva e visual, bem como dificuldade na elaboração de sínteses mentais e no uso adequado das funções executivas. Essas crianças também podem apresentar desestruturação do esquema corporal e desorganização perceptiva, o que interfere na compreensão espacial e na coordenação de movimentos mais refinados.
Desatenção e aprendizagem
Durante a infância, esses sinais podem ser observados logo nos primeiros anos escolares. A criança desatenta frequentemente demora para iniciar atividades, esquece materiais, perde lápis, borrachas e cadernos, esquece-se de anotar ou realizar a lição de casa e, muitas vezes, não consegue seguir instruções que envolvem mais de uma etapa. Apesar de aparentar calma, sua mente encontra-se dispersa, o que compromete o processamento da informação e a aprendizagem. Esse padrão pode levar a baixo rendimento escolar, sem necessariamente gerar comportamentos disruptivos, o que contribui para que o problema passe despercebido.
No ambiente escolar, a falta de atenção pode ser confundida com desleixo ou desinteresse. A criança não termina as atividades no tempo proposto, necessita de supervisão constante, distrai-se com estímulos irrelevantes, e frequentemente pode não responder ao que lhe é perguntado, por distrair-se. Professores relatam, com frequência, que tais alunos “estão sempre desligados”, o que pode contribuir para o desenvolvimento de baixa autoestima, sentimento de inadequação e, em alguns casos, sintomas depressivos.
Desatenção e ambiente familiar
No ambiente familiar, a pessoa com TDAH do tipo desatento costuma apresentar comportamentos que podem ser interpretados erroneamente como desinteresse, imaturidade ou falta de responsabilidade. Crianças e adolescentes com esse perfil frequentemente esquecem compromissos, perdem objetos pessoais, demoram a realizar tarefas simples e precisam de estímulo constante para iniciar ou concluir atividades rotineiras. Esses comportamentos tendem a gerar frustração nos cuidadores, especialmente quando ocorrem de forma repetitiva, mesmo após orientações claras e reforçadas.
A dificuldade em manter o foco durante conversas, por exemplo, pode ser percebida pelos familiares como descaso ou má vontade, quando na verdade trata-se de uma dificuldade neurobiológica de sustentação da atenção. Isso pode comprometer a qualidade do vínculo familiar, pois o indivíduo é visto como “desligado”, “relapso” ou “desobediente”. Situações como deixar a luz acesa, não lembrar de apagar luzes ou esquecer de trazer um recado da escola são comuns e, sem o devido entendimento, podem gerar constantes repreensões, criando um clima familiar tenso e desgastante.
Além disso, o baixo senso de urgência e a tendência à procrastinação dificultam o cumprimento de rotinas, como se preparar para sair, organizar os materiais escolares ou realizar tarefas domésticas. É comum que os pais precisem repetir as instruções diversas vezes ou acompanhar cada etapa da tarefa para garantir sua realização. Com isso, surgem sentimentos de sobrecarga parental e até conflitos entre irmãos, que percebem uma “diferença de tratamento” em relação às exigências feitas a cada um.
A autoestima da criança com TDAH desatento pode ser prejudicada quando ela se percebe como alguém constantemente cobrado, corrigido ou comparado negativamente aos irmãos ou colegas. O ambiente familiar, portanto, deve buscar formas de apoio e adaptação que favoreçam a autonomia gradativa, o uso de estratégias organizacionais e a valorização dos pequenos progressos.
A estruturação de rotinas visuais, listas de tarefas, combinados claros e previsíveis, bem como o uso de reforço positivo são elementos fundamentais para ajudar essa criança a se sentir mais segura e capaz. É igualmente importante que os pais recebam orientação e suporte profissional, a fim de entenderem a natureza do transtorno e desenvolverem estratégias de manejo comportamental mais eficazes.
A convivência familiar pode tornar-se mais harmoniosa quando há compreensão de que o déficit de atenção não está relacionado à má vontade, mas sim a um padrão persistente de funcionamento cognitivo. O acolhimento e o respeito às limitações, combinados com estímulos adequados, são elementos-chave para o desenvolvimento emocional e relacional saudável da pessoa com TDAH do tipo desatento.
Diagnóstico do TDAH apresentação desatenta
O diagnóstico do TDAH com apresentação desatenta exige uma abordagem multidimensional e cuidadosa, pois os sintomas costumam ser menos evidentes do que no subtipo combinado ou hiperativo-impulsivo. Avaliações isoladas não são suficientes. É necessário realizar entrevistas clínicas com os pais e professores, aplicar instrumentos padronizados de rastreio e observar o comportamento do aluno em diferentes contextos. A identificação deve considerar a persistência dos sintomas por pelo menos seis meses, a manifestação em dois ou mais ambientes (escola, casa, etc.) e a ocorrência de prejuízo significativo no funcionamento acadêmico, social ou ocupacional.
Por não apresentarem comportamentos impulsivos ou agitados, essas crianças tendem a ser diagnosticadas mais tardiamente. A ausência de hiperatividade faz com que o problema passe despercebido por um longo período, sendo identificado apenas quando os prejuízos escolares ou emocionais se tornam evidentes.
Durante a avaliação, deve-se descartar outras condições clínicas ou transtornos do neurodesenvolvimento com sintomas semelhantes, como dificuldades de aprendizagem, Transtorno do Espectro Autista, transtornos de ansiedade ou depressão. Em muitos casos, é necessária a colaboração de uma equipe interdisciplinar, composta por psicólogo, neuropsicólogo, psicopedagogo, fonoaudiólogo e médico psiquiatra ou neurologista.
O TDAH na Vida Adulta
O TDAH não é uma condição restrita à infância. Estudos recentes indicam que de 50% a 75% dos casos persistem na vida adulta, embora os sintomas possam se manifestar de forma atenuada, muitas vezes circunscritos a situações específicas, como o ambiente de trabalho. No adulto, os principais impactos relacionam-se a dificuldades laborais, acadêmicas, interpessoais e emocionais.
Entre as manifestações mais comuns em adultos com TDAH, destacam-se:
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Desorganização crônica;
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Perda frequente de objetos;
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Atrasos recorrentes;
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Impulsividade verbal;
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Irritabilidade e explosões emocionais;
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Insegurança e baixa autoestima;
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Inquietação motora (mexer pernas, dedos, balançar o corpo);
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Impaciência em filas e em atividades que exigem espera;
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Incapacidade de manter o foco por períodos prolongados;
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Início de múltiplos projetos sem finalização;
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Dificuldade de planejamento e gerenciamento de tempo;
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Esquecimentos frequentes durante conversas e tarefas;
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Sensação persistente de inadequação e fracasso.
Essas dificuldades comprometem a estabilidade profissional e emocional, gerando frustrações e, em alguns casos, abandono precoce de empregos ou relacionamentos. O suporte familiar é essencial e deve incluir acolhimento, compreensão e incentivo à busca por acompanhamento especializado.
O diagnóstico precoce e preciso do TDAH é fundamental para minimizar os prejuízos acadêmicos, emocionais e sociais. Um diagnóstico adequado pode favorecer o desenvolvimento da concentração, prevenir quadros depressivos, melhorar as relações interpessoais e orientar escolhas vocacionais mais apropriadas.
Durante muito tempo, acreditou-se que o TDAH desaparecia na adolescência. Contudo, pesquisas recentes demonstram que a sintomatologia pode persistir na vida adulta, mesmo que sob formas mais sutis, em razão do amadurecimento neurológico e da reorganização dopaminérgica do cérebro.
A resistência ao diagnóstico ainda é um entrave significativo, pois muitos pais consideram os comportamentos hiperativos como algo próprio da idade. No entanto, a negligência no reconhecimento do transtorno pode resultar em sérias consequências, como uso abusivo de drogas, comportamentos agressivos e, em casos extremos, risco de suicídio.
É imprescindível que o diagnóstico seja realizado por profissional capacitado, uma vez que os sintomas do TDAH podem ser confundidos com outras condições, tais como Transtorno do Espectro Autista (TEA), dislexia, deficiência auditiva, deficiência intelectual, entre outros. Para um diagnóstico completo, recomenda-se a realização de anamnese detalhada com os pais, professores e demais pessoas envolvidas no convívio da criança ou do adulto.
Exames como eletroencefalograma, mapeamento cerebral, tomografia e ressonância magnética não são suficientes para confirmar o diagnóstico do TDAH. A avaliação clínica continua sendo o principal método diagnóstico.
Intervenção e Tratamento
A identificação precoce e o suporte adequado são fundamentais para minimizar os impactos do TDAH e promover o desenvolvimento saudável da criança, especialmente no que se refere à autoestima, ao desempenho acadêmico e às habilidades socioemocionais.
O tratamento do TDAH deve ser interdisciplinar e individualizado, envolvendo família, escola e profissionais especializados. A intervenção deve ser estruturada e precoce, com estratégias adaptadas às necessidades específicas de cada criança.
A psicoterapia, especialmente a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), é amplamente recomendada. Essa abordagem tem se mostrado eficaz tanto no desenvolvimento de habilidades de autorregulação, planejamento e controle atencional, quanto na reestruturação de pensamentos disfuncionais e na promoção da regulação emocional. A psicoterapia pode ser aplicada individualmente ou em grupos, dependendo da necessidade clínica.
Intervenções comportamentais são fundamentais tanto no contexto familiar quanto escolar. Envolvem a adoção de regras claras, rotinas bem definidas, reforço positivo e, quando possível, o treinamento parental. Estratégias pedagógicas específicas devem ser implantadas no ambiente escolar, como a organização das tarefas, uso de estímulos visuais, divisão de atividades longas em etapas menores, oferta de tempo adicional para execução das tarefas e supervisão frequente.
Embora o TDAH não seja classificado como um transtorno específico da aprendizagem, os comportamentos desatentos e impulsivos afetam diretamente o desempenho acadêmico. Nesse sentido, a psicopedagogia pode oferecer suporte valioso por meio de jogos terapêuticos e técnicas que favorecem a atenção e a organização.
Nos casos em que coexistem transtornos de leitura (dislexia) ou de expressão escrita (disortografia), é recomendado o acompanhamento fonoaudiológico para trabalhar as dificuldades específicas de linguagem e psicopedagógico para trabalhar as dificuldades de aprendizagem.
Quando o prejuízo funcional é significativo, considera-se o uso de medicação, geralmente psicoestimulantes prescritos por médicos psiquiatras ou neurologistas. A decisão pelo tratamento farmacológico deve levar em conta a gravidade do quadro, a idade da criança, os potenciais riscos e benefícios, e a concordância da família. A automedicação é contraindicada, sendo imprescindível o acompanhamento médico contínuo para ajustes de dose e monitoramento de possíveis efeitos colaterais.
O sucesso do tratamento depende da atuação conjunta entre pais, professores e terapeutas, com o objetivo de estabelecer um ambiente estruturado, previsível e acolhedor, que favoreça o desenvolvimento global da criança com TDAH.
Terapias Complementares
Algumas abordagens alternativas, como yoga, meditação, tai chi chuan, massagens terapêuticas e o uso de florais, têm sido utilizadas como complemento ao tratamento convencional. Embora não substituam a psicoterapia ou a medicação, podem contribuir para a redução da ansiedade e melhoria do autocontrole, especialmente em crianças maiores. Segundo relatos de professores, crianças submetidas a essas práticas apresentam comportamento mais calmo e maior engajamento em sala de aula.
A terapia psicomotora também pode ser benéfica, auxiliando no desenvolvimento da coordenação motora, orientação espaço-temporal e equilíbrio corporal.
A Intervenção da Escola no Atendimento ao Aluno com TDAH
Ao se deparar com estudantes diagnosticados com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), a escola assume papel fundamental na elaboração de estratégias pedagógicas que favoreçam o processo de ensino-aprendizagem, minimizando os prejuízos que a sintomatologia pode causar ao rendimento escolar e à convivência coletiva.
A atuação escolar deve ter como objetivo não apenas promover a inclusão, mas também assegurar um ambiente estruturado, estimulante e adaptado às necessidades cognitivas, comportamentais e emocionais desses alunos.
A seguir, são apresentadas algumas orientações pedagógicas que podem contribuir significativamente com o manejo em sala de aula:
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Tornar as aulas mais dinâmicas e interativas, substituindo metodologias monótonas por propostas mais envolventes, que favoreçam a participação ativa do estudante. É importante, entretanto, que o professor mantenha equilíbrio entre estímulo e contenção, evitando a superestimulação que pode resultar em agitação exacerbada.
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Aproveitar o potencial criativo e exploratório dos estudantes com TDAH por meio de atividades interdisciplinares, especialmente com professores de artes, educação física ou tecnologia. Crianças e adolescentes com esse perfil tendem a se engajar melhor em propostas que envolvem criação, construção, movimento e resolução de problemas concretos. Na vida adulta, essas características podem ser bem aproveitadas em áreas como design, publicidade e artes visuais.
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Posicionar o aluno com TDAH próximo a colegas mais tranquilos e concentrados, evitando que sua agitação seja reforçada por pares igualmente inquietos.
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Manter o estudante próximo ao professor durante as explicações e monitorar se está conseguindo acompanhar o ritmo da turma. Esse recurso também contribui para reduzir as distrações e fortalecer o vínculo pedagógico.
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Utilizar recursos visuais, como quadro de rotina com as atividades do dia, de modo a oferecer previsibilidade, clareza de regras e sensação de segurança, favorecendo a autorregulação.
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Propor tarefas de curta duração e objetivos claros, possibilitando que o aluno as conclua antes de perder o foco. Atividades mais extensas devem ser divididas em etapas, com acompanhamento constante.
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Permitir saídas programadas da sala de aula, como a entrega de recados ou busca de materiais, respeitando sua necessidade de movimento. Para isso, pode-se utilizar um sistema de autorregulação, como a marcação de três riscos no quadro, cada risco representa uma saída permitida, que o próprio aluno apaga ao utilizá-la. Essa estratégia favorece o autocontrole e estabelece limites de forma positiva.
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Valorizar os comportamentos adequados, por meio de elogios e reforço positivo, tanto por parte do professor quanto dos colegas. Reconhecer o esforço e as conquistas do aluno contribui para o fortalecimento da autoestima e do sentimento de pertencimento ao grupo.
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Manter uma agenda de comunicação entre a escola e a família, permitindo o acompanhamento frequente das condutas e avanços do aluno, e evitando que a troca de informações se restrinja a reuniões formais.
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Aproveitar as aulas de educação física como ferramenta terapêutica complementar, dado que a prática de atividades motoras auxilia na liberação de energia, promove o equilíbrio neuroquímico, estimula funções executivas e favorece o desenvolvimento da lateralidade, frequentemente comprometida nesses estudantes.
Considerações Finais
Um dos principais entraves na abordagem do TDAH ainda reside no desconhecimento por parte de educadores e familiares. Muitos estudantes permanecem durante anos sendo rotulados como indisciplinados, desinteressados ou imaturos, quando na realidade apresentam um transtorno neurobiológico que exige diagnóstico e intervenção precoce.
Portanto, quando o educador perceber sinais consistentes de desatenção, impulsividade e hiperatividade em diferentes contextos, é fundamental orientar a família a procurar ajuda especializada. O acolhimento, a quebra de preconceitos e o compromisso com o bem-estar da criança ou adolescente devem prevalecer sobre qualquer julgamento prévio.
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Como referenciar este texto:
SAMPAIO, Simaia. TDAH - Transtorno de Déficit de Atençãoe Hiperatividade: informações e orientações. Psicopedagogiabrasil, 2025. Disponível em: <https://www.psicopedagogiabrasil.com.br/tdah-simaiasampaio>. Acesso em: dia, mês e ano.
Revisado em 14/06/2025